ZABÉ CEGA E O MENINO SE FOSSE GUIA DE CEGO

 

Zabé foi uma cega pedinte de profissão, pois outra opção na vida nunca lhe apareceu e no sertão daquele tempo, que nem hoje, viver é, antes de tudo, não morrer de fome. Quando minha mãe Isabel era criança, Zabé já tava na lida era do tempo da minha vó solteira. Eu não lembro do trem porque o Ramal da Grota (Sr do Bomfim- Iaçuvis) foi desativado em 76 quando a queda do vão do meio do pontilhão do Paraguaçu na boca dofinal de linha do ramal despencou pra dentro do rio. Eu vi uns 2, 3 trens passando oir esses trilhos mas eram da manutenção da Leste.
Sim, Zabé fazia o percurso da linha do trem, ficava reversão as feiras do trecho e fazendo ponto no comércio e pedia nos corredores do trem e mesmo depois de desativada a linha ela continuou no roteiro pois já fazia a combinação do seu deslocamento com o transporte rodoviário que ampliava sei raio de ação e ela chegava a lugares onde o trem não passava.

Acabou o trem, tinha o ôndibus lembro dela pela última vez por volta de 1984, Jacobina era a principal praça do seu labor, então cresci a vendo pela cidade e pela região. Lembro de já tê-la visto em Itaberaba, Migué Camon (morei nas 2), Caén, Capim Grosso, Várzea Nova, Junco, França, Ruy Barbosa..;1989 quando por um tempo voltei a morar na cidade não mais a vi, me nuticiaro que havia falecido.
Zabé era uma cega criada na brutalidade da aridez sertaneja, no carrancismo do lajedo, seco, teve que se virar sozinha quase sempre viajava sozinha, poucas vezes a vi com guia.
Eu sempre ficava imaginando o que uma pessoa que se deslocava constantemente pelo mundo já tinha passado sem ter visto; nunca soube aonde era a sua casa, nem da sua parentagem, ela morava embaixo de um capacete de alumínio que sempre estava usando.
Se fosse pra ter sido guia de cego, queria que tivesse sido dela.
O outro cego que tive mais proximidade foi seu Nelson, um negro alto que tinha uma padaria e ele mesmo despachada e passava o troco; contava os pães, pegava o pacote de bolacha, tateava as notas e as moedas e passava o troco; era dono da casa que morava e da padaria, tinha 2 filhas que enxergavam, 1 que não lembrei o nome jogava futebol com as meninas no colégio e sempre me chamava pra pegar no gol. Com seu Nelson, com certeza não teria emprego de guia, só pra entregar pão.

QUERO ATÉ ESQUECER QUE VOCÊ EXISTE

A certeza que jamais tive
Que se deixar de te amar
Meu coração, coitado, ele sobrevive
Uma grande ilusão 
De todas, a maior que tive
E este é o instante, o momento de acabar
Nada mais vai restar
Mesmo que agora deixe-me triste
Quero até esquecer que você existe
Pra não ter que lembrar
Pensar não ser permitido
Nada vai significar
Esse tempo que foi perdido
Idealizado uma paixão 
Ter sonhado iludido
Coisas da imaginação 





PINGADEIRA

Com muita ternura eu venho te informar 

Que você é muito importante 

Nessa vidinha tão desimportante

Que a gente vive por aqui

Esqueço de tudo

Menos de ti

Que em mim estás

A todo instante

As lágrimas que choras

Sofro por cada uma, por horas

Até que cesse a derradeira 

Os meus olhos se transformam em pingadeira

É só água que desce

Mundo vai desabar

Não tem jeito que cesse

Enquanto você não parar (de chorar)

Nossos abraços 

Te tenho entre meus braços

Sempre prontos a lhe receber

O aperto é o conforto 

Que esse seu poeta torto

Tem pra te acolher

Se fica no seu coração o lugar aonde moro

Toda vez que ficar triste 

Se você chorar eu choro

Não espero pra depois

Sou a outra parte triste que existe

Pois quando sofres, sofremos os dois


NO TEMPO DO BISCÓ

Subia pelos ares
Fedia na cidade Baixa, Largo dos Mares
Barraco na beira do rio
Curtino fastio
Segurei as pontas
Morei ás margens
Beira do Rio das Contas
Tenho aquelas imagens
Na lavoura cacaueira
Sustentou uma oligarquia inteira
Regando uma flor murcha
Parasita brasileira
Veio a vassoura-de-bruxa
A conta chegou
Galinha dos ovos secou
O sonho dourado daquela burguesia
Que vivia que nem lesma
Mudou da noite pro dia
A coisa ficou séria
trabalhador ficou na mesma
Já vivia na miséria.
 
Eu já lavrei cacau
Mas me dei mal
Plantação do coronel
Mel com gosto de fel
Tinha que catar cajá
Gomo de Jaca pra chupar
O povo que empunha o biscó
Sempre levou a pior

A AMIGA DELA

Não tens dimensão

Do estrago que causaste

Em meu pobre coração

Quando vais numa viagem

Fica sem mandar mensagem

De mim não queres saber mais não

Porque c’ê foi embora?

Te perdi na multidão

Volta, venha logo sem demora

Fosse eu vinha agora

Quero tanto botar pra fora

Essa cruel solidão

E, findando, tenho algo a dizer

Quero que fique sabeno

Tem um coração sofreno

Com saudades de você

 

Inda ontem tava nóis aqui de boa

Apareceu outra pessoa

Começas-te a flertar

Então eu fiquei a toa, foram as 2 passear

Sabe lá que fizeram além do passeio

Eu levei foi um vareio

Com certeza estavam a namorar

Dizes que é só uma amiga

Não quero fazer intriga mas me custa acreditar

E, findano, tenho algo a dizer

Quero que fique sabeno

Aqui tem um coração sofreno

Com saudades de você


 

VALTER VELHO DE GUERRA

Esculpiu sua arte nas sobras da caatinga destruída
fez chinelo pra garantir sua comida
Um artesão de arte, de trabalho
de produção
ganhador do pão
artista pião.
Um homem brabo
Sem conchavo
Um nativo Operário
Fazedor de percata
Rebeldia nata 
Daqueles amigos que não mais se acha
Pensava fora da caixa
o mundo lhe pertubava
Ele se revoltava
Na justa rebeldia
Vida livre
O rebelde queria
sonhou um outro mundo
Viveu o desgosto profundo
Dos inquietos
Era do couro, da madeira
do chá e da bebedeira
O mais talentoso artesão
dos que sonharam na minha geração
Disposição pra labuta
Sem medo de topar a luta
Hoje embaixo da terra
Saudades para sempre
Valter Velho de guerra 
Um  artista  
que não abaixou a crista

TERÇA-FEIRA NO PARQUE SANTO ANTÔNIO

Vários dias que não comia

Vivia do wi-fi emprestado pela vizinha 

Que chamava de tia

E há dias não a via 

Será que também padece? 

(Taí alguém que não merece)

Na net a gente esquece

Espairece o sofrimento 

Virtualmente, as coisas são boas

Se ao menos o INSS desse Deferimento

Ao seu pedido de LOAS

Vendia o ferro de passar roupa, o dvd 

Prancheta, escova de fazer o black 

(Já dava pra comprar um back)

Vendia o som 3 em 1 (disco nenhum!)

Tinha outro celular na fita, tela trincada

As cartelas de remédios acabando

Os cara da biqueira avisando (Tá foda Djhow!)

A fatura chegou, O futuro acabou

No desespero

Apontando a marmita fria de comida sem tempero

Ofereceu (meu!), o violão 

Já não bastava não ter o que comer 

Ter fogão 

E não poder acender

Depois que acaba o gás 

Do botijão

O isqueiro tá só a pedra (também sem gás!)

Nem uma bagana perdida pelo chão 

Caso ache (de praxe!) não vai poder acender maisss


ESTRADA DO DESAGUAR

Seguino a estrada do desaguar

Se quem já não mais vai chegar

Deixou seus passos na areia da água 

Represada de tanta mágoa

Carrancismo por pirraça

O que não foi forjado na raça

Se evaporou, virou fumaça

A bordo de um comboio de cometas

Combo que explode pedras

Com a força de 77 mil marretas

Estridentes que nem as trombetas

Da Serra do Tombador

Vento assovia na ribanceira

Zanza na Macaqueira

E o som da carranca na raiz do maracujá

Enramado na sombra do Jatobá

Casca na cana caiana

Colher-de-pau, pilão de umburana

Mandacarú de facho

Cascavel de rodilha na toiceira

Desceno rio abaixo

Na curva do Roncador

Lajedão do Riacho

Fazeno currião e percata

Curtino o couro cru da vida ingrata

Chinelo de dedo

Pisa o espinho da caatinga

carregano garotos sem medo 

Meu amigo, nunca mais

O mundo lhe foi pesado

A vida não lhe trouxe paz

8, 9 amigos que te choram

E ninguém mais


PALHA DE MILHO

Teve um ou uma sem-vergonha  Que entocou a palha  A palha pra  enrolar a pamonha Pegou, botou pra secar, guardou Pra depois queimar com maco...